Há quase 30 anos, mais precisamente em fevereiro de 1997, a chamada principal da Revista Forbes apresentava um artigo do Prof. Srikumar S. Rao da Columbia University que mostrava que a falta de controle sobre os crescentes custos indiretos podia literalmente acabar com as organizações.
No artigo, o Prof. Srikumar citava o exemplo real de uma empresa americana gigante que encontrou uma oportunidade de crescimento com a falência de sua principal rival. Porém, ao contrário do que imaginava, ela passou a ter prejuízo e não um aumento do lucro!
Ao investigar um pouco mais, esta empresa incrivelmente descobriu que seu produto “carro-chefe” na realidade era deficitário, e outros que imaginava que eram deficitários na verdade eram os produtos mais rentáveis desta organização. E isto acontecia por uma má alocação dos custos indiretos.
Alocar custos indiretos
Como uma empresa tão grande e inteligente poderia ter cometido um erro tão básico? Descobriu-se que a organização estava alocando depreciação e outros custos indiretos com base no custo da mão de obra direta.
Um produto que consumia 20% de mão de obra acabava levando também 20% de depreciação e overhead. Porém há um grande erro aqui: a mão de obra não deprecia, as máquinas sim.
E onde há muito consumo de mão de obra, geralmente menos maquinário é requerido. Moral da história: os produtos que consumiam muita mão de obra deveriam ter recebido menos depreciação e overhead – exatamente o oposto do que foi calculado.
O perigo está no fato de que os custos diretos são de fácil apropriação: é muito fácil saber quanto temos por exemplo de uma matéria-prima num produto ou por exemplo de um Caixa de Banco em um determinado Serviço. Agora e os custos indiretos? Como alocá-los de forma correta e coerente, respeitando uma relação de causa e efeito?
Uma falha neste processo, em longo e médio prazo, muitas vezes é a causa da ruína dos negócios.
Os custos indiretos, se não bem alocados, podem matar seu negócio
É necessária muita prudência com qualquer modelagem de custos que aloca mecanicamente os custos indiretos.
E lembre-se: depreciação é apenas um dos muitos itens indiretos! Os custos indiretos podem incluir tudo, desde o papel higiênico no banheiro, até os custos de TI, RH e das áreas de apoio. A solução “preguiçosa” é alocá-los proporcionalmente a volumes de produção, transações ou faturamento.
Para complicar, estes indiretos estão cada vez mais representativos, e por várias razões. Entre elas, podemos citar aumento da automatização, com a nítida “troca de pessoas por máquinas”, mas também com o fato de que o aumento da diversidade de produtos, serviços, clientes, canais, fornecedores e máquinas (ou seja, o aumento da complexidade do negócio) traz consigo, embutidos, um aumento dos custos indiretos em razão de aumento do esforço administrativo, ou seja, do esforço de gestão desta complexidade.
E historicamente, estes custos indiretos só aumentam. Consequentemente, aumentam também as distorções causadas por rateios arbitrários. É muito comum encontrar nas empresas situações em que um produto que imaginam ser o “carro-chefe” na realidade é deficitário. Por outro lado, produtos que acreditam ser os “patinhos-feios”, não raro são os produtos mais rentáveis da companhia, e aqueles responsáveis por ainda conseguir manter as margens da empresa no azul.
Como resolver o problema de alocação de custos?
Imagine que três amigos decidem sair para jantar. O primeiro está de regime e pede uma salada com água mineral. O segundo amigo pede um belo filé com um vinho e o terceiro pede uma lagosta com um espumante e sobremesa. Ao final do jantar eles pedem a conta que é repartida igualmente entre os três amigos.
Este rateio parece correto para você? Aqui é fácil identificar os erros, e até achá-los absurdos, mas estas distorções acontecem todos os dias em muitas empresas no mundo inteiro!
Agora, se você pedir uma conta para cada amigo, onde cada um deles pagará somente o que consumiu, estamos falando de ABC, o “activity-based costing” ou simplesmente “custeio baseado em atividades” que potencialmente acaba com estas distorções nas organizações e dá um tratamento adequado também a estes custos indiretos.
Resolvendo os custos indiretos com a aplicação do custeio ABC na prática
Com alguns exemplos práticos, é mais fácil visualizar o peso dos custos indiretos e entender como o método de custeio por atividades permite identificá-los e alocá-los de forma mais precisa.
Exemplo 1: custos indiretos gerados pela atividade de Faturamento
Pegue uma simples atividade de Faturamento: seu custo total é a combinação de salários e benefícios das pessoas envolvidas com esta atividade.
Esse total tradicionalmente teria ido para um pool de “despesas gerais”, para ser alocado arbitrariamente. Porém, com o ABC você divide esse valor por uma medida não financeira, como o número de faturas geradas.
Assim, você tem o custo por fatura. Conte o número de faturas geradas por produto, multiplique por este valor e aloque por produto – este é o valor da atividade “Faturamento” em cada um de seus Produtos. Além de eliminarmos as distorções, conseguimos um KPI (indicador de performance) importante para a gestão do negócio: o valor de faturar por fatura emitida.
A partir deste dado, pode-se aplicar estudos de redução de custos, possibilidades de terceirização e mesmo acompanhamento mensal. Algo que simplesmente não seria possível antes do custeio por atividades.
Exemplo 2: custos indiretos gerados pela atividade de Contratação de Funcionários
O custo desta atividade é relativo ao esforço da área de RH, especificamente com a contratação de funcionários. Ou seja, deve ser separado de outras atividades, como fazer folha de pagamento, avaliar funcionários, treinamentos, etc.
Suponha que num determinado período foram contratadas 10 pessoas. Destas, 5 pessoas para a Produção, 2 para Manutenção e 3 para Vendas. Assim sendo, os custos desta atividade “Contratar Funcionários” devem ser distribuídos 50% para Produção (que posteriormente serão alocados para os Produtos, também por atividades), 20% para Manutenção e 30% para Vendas.
Além de conseguirmos alocar os custos desta atividade, ganhamos um KPI importantíssimo para tomada de decisão: o custo de contratar por funcionário – este valor pode ser comparado com o gasto mensal dos últimos meses, da meta da empresa ou mesmo do custo de se terceirizar esta atividade.
Aplicando redução de custos por meio da análise dos custos diretos e indiretos
O potencial aqui não está restrito aos custos indiretos! Existem diversos custos diretos, por exemplo da produção ou de servir aos clientes e canais, que podem (e devem!) ser abertos por atividades como veremos nos exemplos a seguir:
Exemplo de redução de custos em Manufatura
Imagine que você trabalha em uma indústria e recebeu a incumbência de cortar 10% dos seus custos. O que faria?
O caminho natural aqui é tentar entender que ações implementaria para este corte, e para isto é importante entender como os custos estão hoje distribuídos.
- Salários: R$ 300.000
- Benefícios: R$ 100.000
- Matéria-Prima: 150.000
- Aluguéis: R$ 30.000
- Total: R$ 580.000
Com muita criatividade, algumas opções possíveis para reduzir custos aqui incluiriam:
- Demitir funcionários
- Terceirizar funcionários
- Reduzir benefícios
- Trocar a matéria-prima (para uma de menor qualidade)
- Renegociar aluguéis, etc.
Repare que todas as opções de redução de custos estão vinculadas às informações que a empresa nos proporcionou. E como a única informação gerencial que temos é o valor gasto com estes custos e despesas, estaremos limitados a ações relacionadas a isto!
Agora… imagine por um momento se estes mesmos gastos fossem abertos por atividades, considerando seus custos diretos e indiretos. Algumas delas certamente incluiriam:
- Produzir produtos: R$ 150.000
- Entregar produtos: R$ 100.000
- Movimentar materiais: R$ 80.000
- Preparar máquinas: R$ 70.000
- Fazer manutenção corretiva: R$ 60.000
- Resolver problemas na produção: R$ 30.000
- Reprocessar pedidos: R$ 25.000
- Preparar relatórios de vendas: R$ 20.000
- Retrabalho na produção: R$ 20.000
- Reordenar pallets no armazém: R$ 15.000
- Contratar funcionários: R$ 10.000
- Outras atividades
- Total: R$ 580.000
Repare que algumas ações possíveis incluem agora:
- Repensar o layout da planta (para minimizar o gasto de movimentação de materiais);
- Entender o porquê de o gasto com manutenção corretiva ser tão alto. Será que fazemos pouca manutenção preventiva? Será que o processo está correto? Será que os funcionários receberam treinamento adequado ou mesmo que os materiais e maquinários usados para se fazer esta manutenção corretiva são os mais apropriados?
- Reprocessar pedidos ou reordenar pallets: por que isto está acontecendo? Que eventos ocorreram para que tivéssemos estes retrabalhos e como podemos minimizar isto?
- Benchmark: é possível entender o custo unitário de cada uma das diversas atividades da empresa e compará-lo entre unidades, com o mercado, com uma meta corporativa ou mesmo com um potencial fornecedor caso a opção seja terceirizar esta atividade.
Perceba que ao invés de focar no gasto específico, estamos agora também fazendo uma gestão por atividades, entendendo quanto cada uma contribui para os resultados da empresa, propondo melhorias e procedendo com uma gestão muito mais eficiente.
Exemplo de redução de custos em organizações de serviços
Imagine agora o mesmo exemplo anterior, mas aplicado a um banco e com uma abertura por atividades desta forma:
- Analisar créditos
- Cobrar clientes
- Realizar transporte de valores
- Fazer gestão de agências
- Coordenar setor
- Processar transações de depósitos
- Fazer gestão de documentos
- Atender clientes private
- Visitar clientes
Após o cálculo das atividades, incluindo a aferição correta dos custos indiretos, descobriu-se que a atividade “Analisar créditos” custava R$ 900.000 por ano. Se o total de créditos analisados foi de 3.000, podemos entender que o custo de cada análise é de R$ 300.
A primeira pergunta a fazer é: qual o valor de cada crédito analisado? Isso porque, frequentemente, o custo do processo é mais caro que o próprio custo do que se está concedendo como crédito!
Em seguida, é importante pensar em formas de se reduzir estes custos. Dos R$ 300 de cada crédito analisado, descobriu-se que R$ 50 eram gastos somente com horas extras dos funcionários digitando a solicitação no sistema antigo de crédito do banco. Esta tarefa de digitar as solicitações, especificamente, poderia ser terceirizada, ao custo de R$ 10/crédito. Temos só com esta atividade uma redução de custos no valor de R$ 120.000,00.
Outras opções incluem repensar todo o processo, digitalizar as solicitações e mesmo fazer benchmark entre unidades para tentar melhorar. E veja, estamos falando de uma única atividade. Saiba mais sobre como é feita a elaboração de um projeto de redução de custos.
Agora imagine este potencial com todas as atividades de sua empresa, as possibilidades são absolutamente infinitas!
A alocação de custos indiretos é decisiva para o sucesso de um negócio
À medida que uma alocação arbitrária de custos indiretos pode ser fatal para uma empresa, uma alocação precisa pode levar a grandes aumentos de rentabilidade, por meio de cortes de custos embasados em dados precisos.
E como as empresas de nossos exemplos, sua organização também pode usufruir de uma redução de custos cautelosa e segura, observando em alto nível de detalhe os custos de cada atividade, a fim de ampliar suas margens de lucro.
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